Esperança

A rotina de quem vive à espera de um novo órgão

Aguardando por um fígado há sete meses, Felipe começou a dividir sua história nas redes sociais

Foto: Carlos Queiroz - DP - Educador físico, Felipe Ribeiro possui síndrome hepatopulmonar

Dividir a rotina para multiplicar a conscientização. É assim que pode se definir o novo momento da jornada do riograndino Felipe Ribeiro, 31, que está há sete meses à espera de um transplante de fígado e, na última semana, resolveu contar sua história nas redes sociais. A decisão veio para despertar a conversa sobre a doação de órgãos que, em muitos casos, como o do educador físico, que possui síndrome hepatopulmonar, é a única possibilidade de cura.

Felipe, mais conhecido pelo apelido de Diow, conta que foi inspirado por uma amiga a dividir mais da espera pelo novo órgão. Segundo ele, a amiga passou a compartilhar muito sobre a doação após perder um irmão, que também esperava por um fígado. "Ninguém fala sobre isso. Comecei a pensar que ela sempre falava sobre isso e eu, que estou doente, não. Por que eu não falo, se eu posso?", reflete. Ele observa que a decisão também se tornou uma forma de aproveitar a condição atual de saúde. "Uma das minhas vantagens é que ainda estou saudável. É muito importante eu falar, porque estou em boas condições para passar isso para outras pessoas", reflete.

Os vídeos, feitos em casa com o celular, falam sobre a evolução da doença e da sensação de viver aguardando pelo transplante. "Depois que postei, muita gente veio me dizer que sabia que estava doente, mas tinha medo de perguntar. Esse foi o jeito que achei de fazer as pessoas falarem sobre isso e, para mim, também está fazendo muito bem", comenta. Outra vontade do jovem é poder se tornar um ombro amigo para quem também aguarda transplante. "Tem gente que está na fila e não quer falar sobre isso com mãe, pai ou amigos próximos, mas talvez fale com alguém que está passando por algo parecido. Eu gostaria de poder passar esse feedback."

A história de Felipe
A convivência de Diow com a síndrome começou em 2022, mas sua jornada médica é mais antiga. Ainda em 2008, após o falecimento do pai por um problema na medula óssea, ele e os irmãos começaram a investigar se poderiam ter uma condição parecida. Dos três filhos, ele foi o único a manifestar alteração nos exames, que mostraram número baixo de plaquetas. "A família ficou apavorada porque talvez eu tivesse um problema na medula. Aí comecei a fazer bateria de exames", relembra. Foram anos de diferentes exames que nada diagnosticaram. Como nunca teve sintoma, Diow continuou a vida normalmente, apenas monitorando com exames de sangue.

Apenas anos depois, no fim de 2020, novas suspeitas surgiram quando a mãe de Felipe notou que ele ficava ofegante ao subir escadas e tinha os dedos e lábios levemente arroxeados. Na época, no auge da pandemia, acreditou que pudesse ser pela inatividade física, já que sempre foi muito ativo. Um tempo depois, já morando em Santa Catarina, onde trabalhava como árbitro de basquete, os sintomas reapareceram. "Não estava cansado, mas outros árbitros notavam que a minha boca ficava roxa quando corria. Eu achava que não era nada e não queria pesquisar, na época estava com medo", relembra. Depois, quando investigou mais a fundo, em agosto do ano passado, Diow recebeu o diagnóstico da síndrome.

Status da espera
Desde que entrou na lista de espera, o mais próximo que esteve do topo foi a oitava posição. O caráter da doença de Diow, conforme ele explica, aumenta o seu Meld, sigla para Model for End-stage Liver Disease, valor numérico usado para quantificar a urgência de transplante de fígado. "Quando entrei, estava em 38º", relembra. No dia da reportagem, estava na 11ª posição. "Data marcada não tem. É quando chegar pra mim. Isso dá uma angústia. Na internet consigo ver a atualização do meu lugar na fila 24 horas. Geralmente eu acordo e vou ver em que posição estou."

Diow diz que a recomendação médica é se manter o mais saudável possível para quando o novo órgão chegar. Não há previsão de quando isso pode ocorrer, mas, desde abril, ele e a mãe passam a maior parte do tempo em Porto Alegre, já que o procedimento deve ocorrer na Santa Casa da capital. "Quando me ligarem, tenho quatro horas pra chegar lá." As vindas a Pelotas, onde a família mora desde 2005, são esporádicas e breves, mas garantem acolhimento durante o processo. "Sempre que dá, marco algo com alguém. Me sinto muito bem com eles [amigos], faz eu parar de pensar no transplante um pouco."


A síndrome hepatopulmonar
Conforme explica a gastroenterologista e professora da UCPel Gabriela Breitenbach, a doença é uma síndrome por apresentar sintomas em mais de um órgão. Nesse caso, no fígado e no pulmão. "Geralmente é causada por um problema do fígado. Com o tempo, esse fígado não funcionando direito vai causar uma alteração nos vasos do pulmão, que é onde acontecem as trocas gasosas", explica. As alterações nessas trocas necessárias para a vida, segundo Gabriela, acarretam os sintomas da doença do fígado, que dependem muito de cada paciente e, também, a falta de ar. "Por isso a necessidade de transplante para resolver a situação", finaliza.


Doação de órgãos
No Brasil, mais de 62 mil pessoas aguardam na fila por um transplante. No Rio Grande do Sul, a fila por transplante de fígado, procedimento que Felipe necessita, é de 176 pessoas. No Estado, a lista de espera por córneas é a maior, com 1,1 mil pessoas. Para ser doador de órgãos no Brasil, é necessário comunicar à família, já que apenas os parentes podem autorizar a doação.

Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

Certificação garante que Petrobras só usa energia renovável Anterior

Certificação garante que Petrobras só usa energia renovável

Arraial da Apajad movimenta a região do Porto Próximo

Arraial da Apajad movimenta a região do Porto

Deixe seu comentário